Espaço Aberto

Artigos e Entrevistas

Foto de Sidnei Oliveira

Jovens: supernutridos de informação, subnutridos de vivências

“Keep calm, work hard and stop the mimimi.” A frase é uma das favoritas nas palestras do paulista Sidnei Oliveira, autor de livros sobre o desenvolvimento profissional e pessoal de jovens, como  “Geração Y”, “Conectados, mas muito distraídos” e “Cicatrizes – O desafio de amadurecer no século 21”. Formado em publicidade, Sidnei deixou uma carreira de executivo em instituições financeiras nos anos 1990 para surfar a primeira onda da internet no Brasil, criando os sites Achei  e Zeek. Depois de vender as empresas para a estrangeira Star Media, e de um período como executivo para a E-Financial Tecnologia, ele decidiu se dedicar à formação de executivos e jovens. Fundador da Escola de Mentores, o consultor de 57 anos diz que os jovens de hoje vivem em “bolhas de ilusão” e alerta para os prejuízos de uma educação excessivamente protetora: “Os pais  subestimam a capacidade dos filhos. Têm um medo danado de lhes dar autonomia”.  

Como surgiu o conceito de geração, do ponto de vista de comportamento?

Nos anos 60, quando a militância pela liberação feminina e o movimento negro ganham força, surge também  um público jovem que busca ter sua voz respeitada. Essas mudanças exigiram dos profissionais de marketing uma nova segmentação do público consumidor e a criação de uma linguagem especifica para esse grupo. Antes, não existia a percepção do jovem como um segmento populacional. A partir dos 18 anos, a pessoa assumia a vida adulta e ponto final. 

Foi a partir daí que surgiram as diversas classificações de gerações?

A partir de então, as empresas de marketing, principalmente as norte-americanas, começaram a distinguir diferentes padrões no universo jovem. A primeira geração é a dos que nasceram após a Segunda Guerra Mundial, nas décadas de 1940 e de 50, um período de aumento na natalidade sem precedentes, que ficou conhecido como Baby Boom – explosão de bebês. Em 1991, Neil Howe e William Strauss lançaram o livro Generations, que discute a história dos Estados Unidos a partir de sucessivas gerações. Eles deram o nome de Geração X para quem nasceu nas décadas de 60 e 70: um jovem mais focado na realização pessoal, individualista, workaholic, muito interessado em alcançar o sucesso precocemente. Posteriormente, a geração que nasceu na década de 1980 e 90, sob a influência da tecnologia, do computador pessoal, da internet e do videogame, foi chamada de Geração Y. A seguinte é a Z, os millennials, a geração que nasceu no milênio. Mas isso não é uma verdade suprema. 

Como se dividem as gerações? Qual a relevância dessas classificações?

A evidência é baseada em pesquisas mercadológicas, mas não existe um consenso sobre quando começa uma geração e termina a outra. Afinal, o que aconteceu em 78 que não acontecia em 1977? O planeta girou e os jovens nasceram diferentes? No meu livro, para simplificar, eu publiquei uma tabela com as décadas fechadas: quem nasceu nas décadas de 1940 e 50, é Baby Boomer; quem nasceu nas décadas de 1960 e 70, é da Geração X; os nascidos nos anos 1980 e 90 são da Y; e os de 2000 e 2010 pertencem à Z. Mas essas classificações são didáticas. Quando definimos uma geração, tentamos registrar a sua conexão com o contexto social e as circunstâncias da sociedade em um certo momento. É muito forte o impacto da sociedade no comportamento do jovem. E é muito forte o impacto que o jovem provoca na sociedade com o seu comportamento. Por isso é importante estudar a juventude. 

Por exemplo?

Nas décadas de 1960 e 70, os baby boomers viveram a juventude em um período de rupturas na sociedade. Os jovens das décadas de 1980 e 90 passaram pela chegada da tecnologia e foram marcados pela ideia de um profissional que ultrapassa os limites na sua relação com o trabalho. O jovem da geração Y vive nas décadas de 1990 a 2000 a adoção maciça da tecnologia e a adaptação da sociedade a essa nova realidade. Já as pessoas da geração Z, que é a mais recente, vivem os efeitos da  integração entre ser humano, trabalho e tecnologia, o que permitiu novos modelos de relacionamento social.

Como, então, você caracteriza cada geração?

Eu prefiro não criar estereótipos a respeito das diversas gerações. Todos nós reagimos de maneira semelhante aos acontecimentos, em certas etapas da nossa vida. Os baby boomers formam a geração mais idosa de todas as que temos no mercado hoje. Mas, quando eram muito novos, tinham algumas atitudes do jovem da geração Z: ansiedade, questionamento, superficialidade, falta de foco. Essas são características da juventude em geral. Há quem hoje os chame de conservadores. Mas espera aí:  essa talvez tenha sido a primeira geração que se prontificou a fazer alguma diferença no mundo, a se posicionar. Essas pessoas, que nasceram na década de 1940 e 50, mudaram a forma como eram enxergados os jovens. Já o pessoal da geração Z, os millenials, já nasceram num mundo conectado. Quando eles chegaram à adolescência, já viviam e respiravam através dos smartphones. Por isso, na geração Z, a ansiedade, a falta de foco, a superficialidade que é natural em todos os jovens são potencializadas por esses instrumentos. 

Como o aprofundamento dessas características afeta o futuro desses jovens e da sociedade ?

Vamos entender as consequências nos próximos 10, 15 anos. Aí é que vamos saber que tipo de adultos estamos formando hoje: se serão adultos mais resilientes ou mais frágeis. Minha sensação é que esses instrumentos potencializam algumas características, dando acesso à grande diversidade de informações, com velocidade, mas, por outro lado,  fragilizam aspectos comportamentais. Percebemos isso pela quantidade de pessoas da geração Y, que já conviveu com computadores e internet, que hoje buscam programas de desenvolvimento comportamentais e de competências como empatia, colaboração e comunicação. 

Mas o acesso à informação não é benéfico para a formação desses jovens? 

Os jovens de hoje estão supernutridos de informação, mas subnutridos de vivências. A informação flui como nunca fluiu, mas faltam aos jovens vivências relevantes, aquelas que deixam cicatrizes e trazem maturidade. Há 30 anos, os pais não mantinham os filhos em casa por tanto tempo. Não havia os instrumentos que hoje facilitam a vida, como a internet. O resultado é que os jovens desenvolviam musculatura emocional. Nós construímos um cenário social que facilita evitar e esconder as falhas. Isso fragiliza o jovem de hoje: eles ficam deprimidos com muito mais facilidade, são mais ansiosos, não conseguem lidar tão bem com as frustrações. Além disso, a categoria jovem, que ia até os 30, está chegando perto dos 40. Não é raro ver pessoas com 35, 40 anos que ainda têm o estilo de vida de um jovem, ou seja, ainda não casaram, não trabalham, não tem autonomia. 

Essas características geracionais se aplicam aos jovens em todos os contextos? 

Obviamente, as características das gerações são mais intensas nas grandes cidades – o ambiente influencia o comportamento. Nas cidades menores, muitos jovens estão mais próximos da geração X, dos que nasceram nos anos 1960 e 70. O padrão de vida também interfere: quanto mais alta a classe social, mais intenso é o comportamento de ansiedade, fragilidade; quanto mais desprivilegiada a classe social, mais o jovem se parece com o de 30 anos atrás.

Você mencionou que a Geração X era de pessoas que tinham uma relação muito intensa com o trabalho. Nas gerações posteriores, Y e Z, esse comportamento em relação ao trabalho se modifica? 

Sim. Nós baby boomers passamos por um aperto muito grande. A vida não era muito fácil.  Quem usufruiu das facilidades que as gerações Baby Boomer e X criaram, nos últimos 50 anos, foi o pessoal da Geração Y e posterior. Os pais desses jovens disseram para si mesmos: “Eu não tive bicicleta quando quis, mas o meu filho vai ter”. E  fizeram menos filhos para poder dar a eles o que não tiveram. A partir dos anos 90, e sobre tudo no século 21, pais, mães, professores, líderes transformaram a educação em algo mais protetor. Esse movimento foi muito exagerado. Os jovens de hoje vivem em bolhas de ilusão. Eles acreditam que têm direito ao prazer, aos bens, simplesmente por existirem; acham que não é preciso batalhar por isso e não é justo exigir deles alguma coisa. Eles esquecem de que, para usufruir de valor, é preciso gerar valor. Entram numa empresa e saem com muita facilidade, porque, na verdade, o seu contexto de vida não vai ser afetado. Se o jovem  mora na casa dos pais, pode falar: “Só quero trabalhar no que eu gosto”. Afinal, não tem de pagar nada, pelo menos nada de essencial. 

Essa super proteção do jovem é típica da elite ou também ocorre em outras classes sociais?

É mais intensa nas classes sociais mais privilegiadas e menos nas mais pobres. Mas os menos privilegiados também adotam um comportamento semelhante ao dos mais ricos. Um exemplo: um pai que ganha R$ 30 mil por mês, de classe média média alta, põe o filho dele numa boa escola, compra um apartamento, dá um quarto só para o filho, com televisão, internet banda larga. Com 19 anos, é provável que esse jovem tenha um smartphone muito bom, notebook, iPad, estude numa boa faculdade e dirija um carro. O curioso é que vemos esse mesmo comportamento naquele pai que também tem um filho de 19 anos e ganha R$ 5 mil por mês. Esse pai, de classe média baixa, mora numa região mais periférica, mas dá ao filho o que consegue:  não compra o iPad, mas um tablet; um smartphone mais barato; contrata a internet menos veloz. Faz um puxadinho na casa para instalar o quarto do filho, compra um carro simples, pago em 48 vezes, matricula o jovem numa faculdade e paga com FIES. A qualidade muda, mas não o que é dado. Todo mundo acaba adotando um comportamento super protetor. O jovem muda de trabalho várias vezes buscando o emprego ideal – aquele em que ele ganha muito, faz pouco e é bastante reconhecido – justamente porque tem a vida garantida em casa. Mas o efeito dessa garantia familiar é muito menor na periferia. Na periferia há um esforço maior de protagonismo por parte do jovem.

Que conflitos surgem nas famílias em razão dessas mudanças? Existe por parte dos pais uma expectativa de gratidão, que não se realiza?

É evidente que isso traz conflitos. Os pais esperam, sim, uma contrapartida. Não necessariamente o pagamento do que foi dado ou uma gratidão declarada. Eles esperam que os filhos honrem o seu esforço, que façam por merecer. Mas o jovem acaba desenvolvendo a expectativa de sempre ter suas necessidades supridas. Geralmente, os  conflitos surgem quando os pais não dão o que o jovem está esperando. O jovem demonstra insatisfação e os pais dizem: “Puxa, já faço tanta coisa por você! Então não vou dar mais nada”. A imaturidade dos jovens entra em choque com a expectativa de reconhecimento dos veteranos. Nessa batalha, o melhor que os pais podem fazer é simplesmente parar de prover e suportar a ingratidão inicial. Com o tempo, o jovem vai perceber que está sendo imaturo.

Qual o papel das redes sociais nesse momento? 

De modo geral, quando olhamos as postagens dos jovens nas redes sociais, não conseguimos mais dizer sua classe social.  Parece que todo mundo está bem, o que, obviamente, é uma ilusão. É uma geração que vive uma ilusão. Ao mesmo tempo, temos os veteranos que tentam repetir a atitude do jovem, a geração Forever Young. Não querem envelhecer, ponto. 

Como é esse grupo?

O comportamento jovem hoje ultrapassa as gerações. Diferentemente do que acontecia há 30 anos, muitos veteranos agora têm jovialidade. Há 30 anos, a expectativa de vida oscilava entre 60 e 70 anos. Hoje, estamos com uma expectativa de vida entre 75 e 85 anos. Daqui a 30 anos, quando o jovem de 20 anos tiver 50, a expectativa de vida pode ser 95. E os veteranos de hoje estão ocupando o espaço que seria dos mais novos. Quando eu tinha 20 anos, uma pessoa de 50 anos estava passando o bastão. Hoje está  todo mundo no jogo. E isso não acontece só no trabalho. Lembra que agora tem Viagra. Muitas mulheres saem de casamentos de 20, 30 anos, e percebem que tem décadas pela frente. Esses homens e mulheres de 50 anos disputam espaço com os jovens. 

Que tipo de conflitos isso gera, na vida cotidiana e sobretudo, no  trabalho? 

No passado, quando um funcionário passava dos 50 e poucos anos de idade, a empresa tirava dele os desafios relevantes e passava para os funcionários mais jovens.  Assim, o jovem ganhava competência na pressão. Hoje, as empresas percebem que os mais velhos têm uma competência que os jovens não têm, e a tendência é manter funcionários sênior pelo tempo que for possível. Por sua vez, estes veteranos se esforçam para não abrir espaço para o jovem. 

Mas no trabalho também existe a super proteção que ocorre nas famílias?

É evidente. Interessante é que os veteranos adotam essa atitude quase inconscientemente, para justificar sua atuação no mundo do trabalho. De uma maneira simplificada, é como se o veterano protegesse o mais novo para não ser suplantado por ele. Teoricamente está ajudando o jovem, mas na verdade está mostrando que é útil e capaz. O efeito ruim disso é que muitos jovens estão se acostumando com isso e contando com essa proteção. 

Mas quando o trabalho exige familiaridade com a tecnologia, os jovens não são privilegiados?

Isso foi verdade há alguns anos. Hoje já não é assim. Há um tempo atrás, o ambiente da tecnologia era cheio de códigos e linguagens que a gente não conseguia interpretar. Hoje, a tecnologia é tão intuitiva que pessoas de 90 anos de idade conseguem utilizá-la sem problema. O domínio da tecnologia já está incorporado à cultura, não é mais um diferencial do jovem. O que o jovem tem, e que o veterano em geral não tem na mesma medida, é energia, velocidade e disposição. Só que o jovem tem velocidade, mas é dispersivo; tem energia, mas quer direcioná-la para o seu usufruto. 

Você pode dar exemplos? 

A maior causa de conflitos nas empresas é o hábito dos mais velhos menosprezarem a capacidade dos jovens, considerando que eles têm uma atitude superficial, mais voltada para a satisfação própria do que para a geração de valor. Eles também criticam uma certa arrogância da juventude, que se alimenta do acesso à informação que os mais novos têm. Por sua vez, os jovens reclamam que os veteranos não lhes dão oportunidade e não querem ensiná-los para não perderem espaço. Mas isso tudo acontece de maneira velada. 

E quando esses jovens se casam? Aí eles não podem mais ser protegidos por todo mundo. Ou podem?

Quem disse que eles casam? A idade de casamento vem aumentando a cada ano. Hoje está se tornando relativamente raro casar antes dos 30 anos. Morar junto também não é necessariamente uma declaração de independência; mesmo quem casa ainda costuma se manter dependente dos pais. E não é raro que estes mantenham o quarto do filho que casou, porque pode ser que o casamento não dê certo. 

Você falou dos erros que os chefes cometem com esse jovem. Os pais cometem os mesmos equívocos?  

Os pais também subestimam a capacidade dos filhos, têm um medo danado de lhes dar autonomia. Pais de filhos de 18, 19 anos, não querem que eles andem de ônibus. Argumentam coisas como: “Ele pode esquecer o ponto, pode se perder”. Mas todos eles têm celular! Antigamente, se a gente se perdia, não tinha celular, e nem mesmo como ligar para alguém do orelhão, porque ninguém tinha telefone em casa. Claro, isso vale para as classes privilegiadas. Quem não tem alternativa,  pega ônibus e pronto. Mas esse é o tipo de pensamento super protetor de que eu estou falando. 

O que você recomenda a pais e educadores, ao lidar com jovens? 

Minha recomendação é: “Para de fazer tanto, deixa ele fazer um pouco”. Tem aprendizados que a pessoa só vai ter se ela viver a situação. Ninguém aprende o que é um choque de maneira teórica; choque, você só aprende levando um. Não vai deixar o filho tomar um choque de 50 mil volts, mas um de 12 volts, tudo bem. O menino só vai sentir um desconforto e aprende a não pôr o dedo na tomada. Em vez disso, os pais tampam as tomadas. Esse é o princípio que, cada vez mais, orienta a educação atual. Tenho pânico de ver um pai ou uma mãe dar um celular para uma criança com menos de cinco anos. Porque não é ela que vai mexer com o celular,  é o celular que vai mexer com ela. 

Sidnei, você não acha a sua visão dos Ys é excessivamente negativa? 

Nem tudo neles é negativo, não, imagina! Mas eu venho estudando as gerações há bastante tempo, e vejo que, aos 35, 40 anos, essa geração Y tem uma estrutura emocional realmente frágil. Essas pessoas terão de lidar com isso; essa fragilidade terá de ser resolvida.  Mas essa me parece ser a hora de alertar para não fazermos a mesma coisa com os próximos. Mas, focando nos aspectos positivos, os indivíduos da geração Y e da geração Z são mais desapegados de conceitos e dogmas. Isso é muito bom, porque permite que eles acumulem uma riqueza de experiências como nenhuma outra geração anterior. Isso faz com que a gente tenha a sensação de que as gerações mais jovens são mais precoces, mais despertas, mais antenadas, mais rápidas do que qualquer outra. Eu tenho recomendado aos veteranos que observem essa atitude dos mais jovens, porque o desapego em relação a conceitos e valores  permite um aprendizado. 

Quando os jovens da Geração Y são pais e mães, como lidam com os seus próprios filhos?

Minha percepção é que esses jovens são um pouquinho mais firmes do que seus pais foram. Eles não querem exercer tanta proteção; estão percebendo que o excesso de proteção os deixou frágeis. Este é um outro ponto positivo. 

Você acha que os Ys são mais desprendidos em relação ao acúmulo de bens, ao consumo? Como cresceram no conforto, eles estariam menos preocupados com bens? 

Mais ou menos. De fato existe uma mudança no comportamento da sociedade como um todo em relação a esse aspecto. A gente está começando a sacar – todos nós, independentemente de geração – que possuir coisas não garante coisa alguma; viver experiências é o mais importante. Ao mesmo tempo, este jovem não abre mão do conforto. Ele não quer ter o carro, mas não abre mão de se deslocar de carro. Ele não quer ser dono de uma casa, mas quer morar num lugar bacana. 

Você tem filhos? Eles são da Geração Y?

Meu filho é Y da gema, tem 32 anos. Minha filha tem 29. 

As relações com eles foram um laboratório para as suas teorias? Fale um pouco da sua experiência.

Ah, foram sim, em certa medida. Essas observações têm a ver com a minha história. Eu nasci numa família de classe média baixa, meu pai era bancário, tive quatro irmãos. Nunca vivemos na miséria, mas também nunca experimentamos a riqueza. Sempre era aquela coisa sofrida. Com 14 anos de idade, eu queria muito algumas coisas, então fui trabalhar no Banco Real. Minha trajetória foi bastante precoce e singular. Com 20 anos de idade, eu já estava na gerência de agência; com 25, já era gerente regional; e aos 28 anos alcancei a diretoria. Isso aconteceu nos anos 1990, uma época que os bancos estavam necessitando de se reinventar. Então, minha missão era bolar coisas novas. Acabei participando de inúmeros projetos de inovação nos bancos, como a automação e a criação da Conta Universitária – um produto que começou no Banco Real e hoje todos os bancos têm. Nesse período, eu também estava envolvido com tecnologia e criei com um amigo um site de busca, chamado ACHEI, que depois vendi.  Posteriormente, eu decidi que eu queria ajudar outros jovens. O jovem não está precisando de professor, ele está precisando de mentor. 

Como você diferencia os papéis do professor e o do mentor?

O professor dá instrução para  você não falhar. O mentor te ajuda  depois que você falhou. O mentor precisa que você falhe, para que ele possa mostrar alternativas, dar referências. O problema é que o modelo educacional é baseado na memória. O professor apresenta  informações para você guardar na memória – depois te submete a provas  pra ver se o conteúdo ainda está lá. Mas ter algo na memória não garante que você saiba o que fazer. Já o mentor tem um caráter mais provocativo. Ele prefere deixar a pessoa falhar. Quando a pessoa falha, perde a capacidade de culpar o outro, pois quem falhou foi ela. A gente aprende mais com os nossos mentores, ou com os nossos modelos, do que com quem nos transmite informações. É aquele princípio de Confúcio: “o que eu ouço, esqueço; o que eu vejo, lembro; o que eu faço, aprendo”. 

Quando os jovens lhe pedem orientação para suas carreiras, suas vidas, tem algum conselho que você sempre oferece? 

Claro: “Keep calm, work hard and stop the mimimi”.  Eu tenho isso em um slide, já virou meme. A frase não é minha, capturei na internet, mas eu gosto muito do princípio. O que mais ajuda um jovem é deixar que ele seja protagonista das coisas. “Ah, mas ele pode errar”. Deixa ele errar. “Mas se ele errar, vai doer”. Sim, claro, faz parte do jogo. Ele tem de descobrir que tem recursos dentro de si, sem contar sempre com os recursos dos outros. Às vezes os jovens reclamam comigo por usar esse tom um pouquinho assertivo. Então eu falo: “Tá bom, cara. Então, vai e faz”. E ele: “Ah, não, mas eu não tenho condição de fazer”. O jovem hoje está muito indiferente, estagnado. Ele está querendo curtir, como todo jovem. Só que ele está descolando isso da contrapartida que ele tem de dar. Quer ir pro play? Legal, só que tem de fazer a lição de casa antes. A qualquer momento em que você exige dos jovens a contrapartida, eles reclamam. Por isso muitos jovens não querem ter filhos, porque ter filhos exige renúncia.

Esse comportamento da Geração Y combina com a exigência de uma atitude empreendedora, cada vez mais intensa?

Um fator que deu força ao empreendedorismo nesta geração é a conjuntura econômica. Tem muita gente desempregada e o empreendedorismo é uma alternativa. Outro fator é a pequena resiliência do jovem diante do mercado de trabalho. Os jovens não suportam mais o esquemão do mercado de trabalho e acham que é possível, através de uma iniciativa empreendedora, ter uma vida mais próspera com menos esforço. Só que ser empreendedor exige muito mais esforço do que ser empregado numa empresa. É uma ilusão. As pessoas que começam um empreendimento logo descobrem que ser empreendedor tem um custo alto. Muitos desistem. O jovem diz: “Não quero trabalhar numa empresa. Não quero ser empregado de ninguém, quero ser meu próprio chefe”.  Só que eles vão descobrir que ser empreendedor exige da pessoa três vezes mais do que um chefe chato. Eu já vi outras ondas de empreendedorismo no Brasil, como a que houve na época do Plano Cruzado, por volta de 1986. Essa que está acontecendo agora parece uma ilusão coletiva.

Entrevista concedida a Anabela Paiva

Alocc @2024 em sociedade com a TNA Gestão Patrimonial